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Caminhar, edificar, anunciar – Nota do Bispo de Beja

1. Sempre a caminho

Na breve homilia da Missa com os Cardeais, após o Conclave, o Papa recém-eleito, que adotou o nome de Francisco, dizia que a Igreja e os cristãos são um povo sempre em movimento, num caminhar rumo à “terra prometida”, seguindo as pegadas e o evangelho de Cristo. Interpelados por Cristo, na obediência à sua palavra, deixamos um mundo, construído a partir de nós e voltado para nós mesmos, abrindo-nos a Deus e aos nossos semelhantes. O Papa advertia que muitos, como Pedro em Cesareia, professam a fé em Cristo como Messias e Filho de Deus, mas pensando num Messias vitorioso e glorioso, num seguimento de Cristo sem cruz. Se assim for, o cristianismo nada mais será que uma instituição piedosa, dizia ele, uma ONG sócio caritativa, apenas voltada para a dimensão material da vida humana, sem o horizonte da vida eterna. O próprio Papa, cardeais, bispos, padres nada mais seriam que um nome, uma função, e não discípulos de Cristo, afirmou o Papa.

Este povo peregrino de batizados, a partir da fé, tem de orientar-se a partir do Cristo como a Bíblia e a fé da Igreja no-lo dão a conhecer. Por isso, o verdadeiro discípulo de Cristo tem de ser missionário, sempre a radicar a sua vida no Mestre e contribuir para o crescimento e fortalecimento do Povo de Deus, sem medo da cruz.

 

2. Povo chamado e enviado a anunciar

Na mesma homilia, o Papa Francisco dizia que, escutando o chamamento de Jesus e seguindo-O, carregando a cruz, não podemos ser meros espectadores ou repetidores da sua vida e mensagem. Precisamos de ser sempre evangelizados, para construir a nossa vida sobre Ele, como rocha firme, sem medo do sofrimento, da cruz, da incompreensão. Precisamos de anunciar e testemunhar a nossa fé, num mundo indiferente ou até mesmo adverso de Cristo, do seu Evangelho, dos seus discípulos.

Os cristãos são, pois, um povo sempre em movimento, que, partindo da profissão de fé em Jesus Cristo, edifica a sua vida e relações ao modo de Cristo e anuncia, transmite e testemunha essa vida nova em Cristo ao mundo.

Estava eu a refletir sobre esta mensagem, expressa em poucas palavras e de modo simples e direto, veio-me à mente uma interrogação sobre a minha própria vida e missão de bispo, assim como dos colaboradores nesta diocese de Beja. Será que pautamos a nossa vida pela de Cristo, nos abrimos como Ele a Deus e às pessoas que vivem nesta terra alentejana? Que Igreja, Povo de Deus, estamos a construir? Como a edificamos?

 

3. A comunidade escolar de Santa Maria na Sé de Beja

Com estes pensamentos na mente, fui celebrar a Eucaristia do quinto domingo da Quaresma e encontrei a Sé Catedral repleta de jovens e adultos, muitos deles professores e funcionários da Escola de Santa Maria de Beja, que comemora neste mês de Março vinte anos de existência. Quis esta comunidade escolar assinalar também com a Eucaristia esse acontecimento, embora muitas pessoas e famílias ligadas a esta escola raramente participe nas celebrações da Igreja. Para mim foi um grande sinal de que ninguém é excluído do amor de Cristo e da missão da Igreja.

Qual não foi o meu espanto ao ver o silêncio, a atenção e participação da assembleia, bem apoiada por um coro de crianças e jovens, por diversos músicos, incluído órgão, por acólitos, por leitores e outros intervenientes em diversos momentos da celebração.

Reconhecendo a autonomia das instituições, constatei uma vez mais quanto é importante que todos colaboremos na construção de uma nova sociedade, mais justa, solidária e fraterna. Família, escola, Igreja e outros intervenientes nas sociedades modernas precisam de colaborar na formação das novas gerações, na transmissão de valores e ideais que ajudem a estruturar os nossos cidadãos no sentido positivo da verdade e vocação do ser humano.

Reconheci também que perdemos muito tempo e recursos em questões secundárias ou a proteger classes privilegiadas, que se pautam pelo egoísmo e não pelo bem comum. E, uma vez mais, me afloraram à mente palavras e gestos do nosso novo Papa, que, recordando S. Francisco de Assis, cujo nome e exemplo assumiu, disse: precisamos de ser mais uma Igreja pobre e para os pobres. Foram eles os preferidos de Cristo e da Igreja nos períodos em que foi mais coerente e missionária, de acordo com o mandato recebido.

Também nesta diocese, bispo, clero e colaboradores na missão, precisamos todos de assumir estas prioridades, novas expressões, métodos, linguagens e pedagogias na evangelização, a fim de sermos a Igreja de Jesus Cristo. Espero que o Sínodo diocesano nos ajude.

 

† António Vitalino, bispo de Beja