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Testemunhas da fé e da esperança – Nota do Bispo de Beja

1. Crise e fé
Num destes dias alguém me perguntava se a presente crise tem trazido mais gente para a igreja. Na realidade muita gente procura as instituições da igreja na busca de soluções para os seus problemas, sendo os de ordem económica e financeira os mais imediatos. Isto fez-me lembrar a sentença popular de que só nos lembramos de S. Jerónimo e Santa Bárbara quando troveja.
Mas hoje batem à nossa porta pessoas sem a mínima abertura para os poderes divinos. No entanto, não podemos fazer aceção de pessoas e temos de escutar e ajudar a todos, segundo as nossas possibilidades, sem descurar o testemunho da fé e da esperança, que deve animar toda a ação da igreja, mesmo a social.
As pessoas que batem à nossa parte precisam de quem as escute e lhes incuta confiança, mesmo nas suas próprias possibilidades. Isto faz-me lembrar a resposta dos apóstolos Pedro e João ao coxo de nascença que pedia esmola à porta do templo. Pedro disse-lhe: ouro nem prata não tenho, mas o que tenho, isto te dou: em nome de Jesus Cristo Nazareno, levanta-te e anda (Act 3, 1 ss).
Muitos dos que nos procuram precisam de ser curados interiormente, para poderem confiar e caminhar, de modo a encontrarem soluções para os seus problemas. A tentação da resposta unicamente assistencialista não resolve os problemas de fundo da nossa sociedade deprimida, embora também possa ser necessária, mas não exclusivamente. Neste tempo de crise e de depressão, não podemos esquecer a nossa missão fundamental. Não podemos esperar todas as respostas para os nossos problemas nem do Estado nem da Igreja. Muitas coisas dependem de nós mesmos e da sociedade civil, a começar pela família. Sem amor, sem autoestima, sem esperança, sem solidariedade e partilha, não ultrapassaremos a crise.
Precisamos todos de mudança de uma sociedade egoísta para cidadãos altruístas, que põem o bem comum e dos que nos estão mais próximos acima do bem-estar individual. Os pobres também podem contribuir para a mudança. Lembremos as viúvas das leituras bíblicas do último domingo. Elas partilharam e deram tudo o que tinham. Deram-se e assim ajudaram o próximo e louvaram a Deus, pondo-O acima de todos os seus bens, embora exíguos.

2. Aprendizagem e exercício da fé e da caridade
De 11 a 18 de novembro a igreja celebra a semana dos seminários, onde se preparam os futuros ministros da igreja. As comunidades cristãs clamam por bons pastores, mas é preciso que olhe para os lugares onde surgem e se formam e também se interesse pelo modo como são formados.
Parece-me que há um grande desconhecimento de parte a parte e as causas estão dos dois lados. Os seminários e as escolas teológicas devem dar a conhecer os seus planos e programas e os párocos e comunidades, a começar pelas famílias cristãs, devem também apoiar quem manifesta sinais de vocação para os ministérios ordenados.
Deixo aqui algumas inquietações para o nosso exame de consciência e revisão dos nossos métodos pedagógicos e pastorais. A formação dos nossos pastores não pode ser apenas de ordem intelectual. É preciso formar as vontades e o coração para se apaixonar por Cristo e capacitar para a misericórdia pelas multidões desanimadas e sem rumo. Não basta criar estruturas e planos pastorais, se não houver atenção às inquietações das pessoas, um bom acolhimento para as escutar e, com elas, procurar as soluções e terapias adequadas.
Anunciar o evangelho, celebrar a fé, rezar, é importante. Mas a fé sem obras é morta ou morre a pouco e pouco. Por isso temos de a testemunhar, mais pelo exemplo que por palavras. A caridade, que se exprime de muitos modos, de acordo com as necessidades profundas das pessoas, é a perfeição da vida cristã. Estaremos a formar os nossos futuros pastores neste sentido?
O Sínodo diocesano que estamos a viver deverá ajudar-nos a repensar a nossa pastoral vocacional e a vida cristã das nossas comunidades.
A Igreja está a viver um Ano da Fé. Não basta professá-la no Credo. Temos de a testemunhar na missão, no acolhimento, na formação, na celebração, no perdão e reconciliação entre os membros da família, os movimentos e serviços paroquiais e diocesanos, para que o mundo acredite em Jesus Cristo, caminho, verdade e vida para todos nós. Através dos sinais de entre-ajuda fraterna, por mais pequenos que sejam, mas realizados com amor, os desiludidos desta sociedade descobrirão um novo rumo de vida.


† António Vitalino, Bispo de Beja